domingo, 24 de dezembro de 2023

A blusa do meu avô

A blusa do meu avô foi uma das peças de roupa mais acolhedoras que eu já tive na vida.
Não sei bem o por quê, mas ela me dava o abraço que ninguém mais me dava. Inclusive quando eu mesma queria me abraçar, mas não conseguia.
Vejo como ela já começa a se desfazer pelo uso. E como foi usada... 
Olho pra ela no armário ao lado de uma outra blusa esquecida por alguém.
Preta e branca, cores mais fortes.
A antiga em tons mais escuros e calmos.
A nova também me traz algum conforto...
Vejo como elas se encaram entendendo a sutileza do momento:
o antigo ia embora
dando lugar ao novo. 
Mas quando eu já estava satisfeita,
entendendo com elas também, a troca que estava sendo feita, percebi que não havia bolso algum na blusa nova.
Como se não permitisse que eu guardasse nada. 
Como se minhas marcas do passado não pudesem ser levadas comigo.
Mas não há caminho sem perceber
que não sou eu que carrego minhas cicatrizes, 
são as minhas cicatrizes que me carregam. 

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